quinta-feira, 29 de maio de 2014

A atuação da osteopatia na gravidez

O tema de hoje é algo que já havia planejado há algum tempo para escrever no blog: a atuação da osteopatia na gravidez. Acontece que foram surgindo outros assuntos e acabei delegando esse tema tão importante para segundo plano. Porém, nas últimas semanas, apareceram algumas pacientes grávidas o que novamente acendeu a ideia de pesquisar mais sobre o assunto. Dessa vez, busquei alguns artigos científicos interessantes sobre o tema e mostrarei para vocês algumas constatações importantes sobre a osteopatia na gravidez.
Primeiro de tudo, por que uma grávida procuraria um osteopata? Experimente perguntar para uma! Ela com certeza dirá que sente dores nas costas, bacia ou quadril. Esses sintomas costumam aparecer no terceiro trimestre da gestação e são caracterizados por uma dor localizada entre a 12a costela e a prega glútea e costuma durar mais de 1 semana.

Região destacada em vermelho mostrando a abrangência da dor apresentada pelas gestantes.

Isso ocorre devido a alguns fatores. Primeiramente, o fato de haver o crescimento do útero e consequente protrusão ou aumento da circunferência abdominal faz com o centro de gravidade da grávida fique anteriorizado ou seja, ele é deslocado para frente o que faz também aumentar a lordose lombar.

Destaque em vermelho para a lordose lombar que se torna aumentada na gravidez.

Segundo, é sabido que na gestação há liberações maiores de hormônios como o estrógeno e a relaxina. Eles são responsáveis pelo aumento considerável da flexibilidade dos ligamentos o que gera uma frouxidão desta estrutura na gestante - isso tem uma explicação fisiológica, pois a mulher grávida precisa de muita flexibilidade na região sacro-ilíaca (a bacia como um todo) para que o bebê possa passar sem problemas pelo canal vaginal em seu nascimento.
Vista anterior da articulação sacro-ilíaca.

Vista posterior da articulação sacro-ilíaca.

Estes dois fatores acabam gerando uma grande instabilidade e aumento de tensão muscular na região de maior suporte da coluna: a lombar. Eu já comentei em meus artigos aqui no blog que a osteopatia trabalha com conceitos importantes de hipomobilidade e hipermobilidade. Geralmente, os sintomas estão relacionados com o aumento da mobilidade da região afetada. No caso das grávidas, a região onde ocorre a maior frouxidão ligamentar é a da pelve (Chang et al, 2013, Guyton & Hall, 2011). Como um osteopata nunca atua na hipermobilidade e sim no local com a mobilidade diminuída, a pelve quase sempre está fora da região de tratamento articular.

Neste estudo de Novaes, Shimo e Lopes, as autoras destacam a grande incidência da dor nas costas nas pacientes grávidas. Segundo elas, 70% das gestantes sofrem com dor lombar e 20% ainda permanecem com um residual dessa dor. Chang et al. (2013) dá um dado ainda mais alarmante, das grávidas com dor lombar, 16% ainda sofrem com esse problema até 6 anos depois do parto.
Voltando ao trabalho brasileiro, as autoras destacam um estudo que transcrevo:
"Num estudo recente no Brasil, na cidade de Paulínia-SP, foi aplicado um questionário a 203 gestantes em uma Unidade Básica de Saúde, sobre a prevalência de algias na coluna vertebral durante a gravidez. Aproximadamente 80% relataram dores na coluna vertebral e pelve, sendo que 51% das gestantes com idade gestacional entre 34 e 37 semanas apresentaram dor que interferia significativamente em suas habilidades físicas e qualidade de vida".

Outro dado importante mostrando como a lombalgia pode afetar não só pela dor que a paciente sofre mas também pelo grau de incapacidade que ela pode causar. 

Neste outro estudo de Taiwan de Chang et al., os autores avaliaram como a dor lombar evoluía no terceiro trimestre de gestação e concluíram que não houve aumento da dor nesse período de tempo mas houve aumento da interferência das atividades de vida diária causada pela lombalgia nas 214 mulheres entrevistadas.
Bom, já perceberam que a dor lombar é bem comum na gestação, certo? Será que a osteopatia pode ajudar em algo tão comum? Acompanhe o estudo abaixo:


No estudo de Licciardone, os pesquisadores avaliaram 144 mulheres que estavam entre a 28a e 30a semana de gestação. Elas então foram designadas aleatoriamente em 3 grupos. No primeiro foram incluídas 48 mulheres e combinava o cuidado obstétrico habitual e tratamento osteopático, o segundo, com 47 integrantes, consistia no cuidado obstétrico habitual mais o uso de ultra-som simulado que além de estar desligado, foi aplicado sobre a roupa. O terceiro grupo com 49 gestantes baseou-se apenas no cuidado obstétrico habitual.
No grupo do tratamento osteopático foram aplicadas técnicas de tecidos moles, liberações miofasciais, músculo-energia e técnicas articulatórias. As técnicas osteopáticas de alta velocidade (os thrusts) não foram aplicadas por serem consideradas contra-indicações relativas pelo motivo que já foi destacado: a frouxidão ligamentar comum nas grávidas. Foram realizadas 7 sessões nos grupos 1 e 2 que coincidiu com a 39a semana de gestação.
Os pesquisadores descobriram com o estudo que houve diminuição da dor das pacientes apenas no grupo que envolvia o tratamento osteopático. No grupo 2 a dor se manteve estável e no terceiro, houve aumento de dor. Porém, os dados não foram estatisticamente significativos, ou seja, apesar de haver diminuição da dor, ela não foi relevante a ponto de se concluir que o tratamento osteopático é realmente efetivo na diminuição da dor lombar nas grávidas. Porém, no outro quesito avaliado, o da função da coluna lombar, houve dados significativos em favor do grupo tratado com osteopatia. Com esses dados, os autores concluíram que a osteopatia como terapia complementar ao controle da dor lombar em gestantes é efetiva não pelo fato de haver diminuição da dor mas por ser capaz de impedir que as grávidas se sentissem incapacitadas de fazer atividades de vida diária o que por si só é um fator importante já que como destaquei anteriormente é comum essa incapacidade nas gestantes. Ainda, citando novamente o estudo Novaes, Shimo e Lopes, elas destacam que nos Estados Unidos os gastos anuais com afastamento do trabalho de gestantes por conta da incapacidade causada pela dor lombar chegam a assombrosos US$13 bilhões! Percebam a importância que a osteopatia pode ter na vida de uma pessoa e na economia de um país.

Destaco também um outro estudo bem interessante. Foi realizado um estudo de caso com uma grávida em trabalho de parto. O objetivo do estudo foi avaliar se a osteopatia seria capaz de facilitar um parto natural sem o uso de medicamentos.


Os pesquisadores acompanharam uma mulher de 30 anos na 39a semana de gestação que entrou em trabalho de parto espontaneamente. Suas queixas eram dores na bacia e coluna lombar e contrações dolorosas a cada 2 horas que, obviamente, foram aumentando à medida que o trabalho de parto evoluiu. 
Durante todo o período, os osteopatas avaliaram e trataram as disfunções apresentadas pela pacientes. Os objetivos das técnicas foram:
  • melhorar as mobilidades de bacia, coluna lombar e sínfise púbica (esta para facilitar a passagem da criança no parto)
  • relaxar a musculatura tóraco-lombar
  • diminuir a dor das contrações
  • facilitar as respirações
  • melhorar a inervação autonômica de útero

Foram realizados procedimentos a cada 2 horas, totalizando em 6 intervenções. O trabalho de parto durou 14 horas. O parto ocorreu sem intercorrências, não houve necessidade de uso de fórceps ou vácuo extrator e nem uso de medicamentos para aliviar a dor o que fez os autores concluírem que a osteopatia ofereceu um papel significativo no parto natural bem-sucedido.
Obviamente, por se tratar de um estudo de caso, existe a necessidade de mais estudos e um número maior de gestantes.
E aí, alguém se anima em ser paciente e ser acompanhada por um osteopata durante o seu trabalho de parto? A possibilidade proposta pelos pesquisadores abre uma nova oportunidade de atuação da osteopatia.Se você é uma gestante e procura uma solução para as dores que a afligem durante a sua gravidez, procure um osteopata e agende uma sessão. O seu problema pode ter resolução sem que você precise ficar sofrendo à toa.


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